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Në Ropë: fisiologia da vida por outra perspectiva



     Sabemos que o conceito de vida é algo complexo, e que suas abordagens e interpretações variam amplamente, dependendo dos campos de estudo e das crenças de uma sociedade. Para Aristóteles, a vida é a capacidade de autodeterminação e movimento por si próprio. Ele acreditava que os seres vivos possuíam uma "alma" que lhes permitia realizar suas funções vitais. Já Charles Darwin contribuiu significativamente para a compreensão da vida com a teoria da evolução. Para ele, a vida era caracterizada pela capacidade dos seres vivos de se adaptarem e se reproduzirem ao longo das gerações. Enquanto isso, Albert Einstein abordou a vida em um contexto cósmico. Ele via a vida como um mistério fundamental e enfatizava a interconexão de todas as formas de vida no universo. Sempre levamos em consideração a interpretação de “definição de vida” segundo filósofos e cientistas renomados, mas aqui vamos tentar correlacionar esses conceitos de acordo com pontos de vista de povos de sociedades mais isoladas, como os Yanomamis por exemplo, sempre correlacionando com conceitos neurocientíficos, a fim de termos uma ampla perspectiva sobre essa problemática e tentar compreender melhor a importância do conhecimento dessas culturas. 

Os Yanomamis são um grupo indígena que habita regiões da Amazônia, na fronteira entre o Brasil e a Venezuela. Eles têm uma cultura rica e única, com características distintas que os diferenciam de outros povos.  Os Yanomamis possuem um sistema social complexo, com regras e normas que regem as interações dentro e entre as comunidades. Eles valorizam a cooperação e a solidariedade, e a tomada de decisões é feita por meio de discussões coletivas. Esses povos vivem em comunidades coletivas, organizadas em torno de famílias extensas e clãs. Eles têm uma forte conexão com a natureza e acreditam na interconexão entre todos os seres vivos e elementos naturais. Os Yanomamis veem a vida como parte de um sistema maior, onde espíritos ancestrais, animais e outros seres da natureza desempenham papéis importantes. Nesse contexto surge o conceito Yanomami de “Në Ropë” (ou Nerope), que é a pré-condição para que a vida ocorra, um ambiente que forneça de forma adequada o fluxo vital, “ A mata sem nerope vira deserto”. Aplicando um conceito fisiológico, seria as condições fisiológicas ideais para que a homeostase exista. 

     A homeostase refere-se à capacidade dos organismos de manter um ambiente interno estável e equilibrado, mesmo diante de mudanças no ambiente externo. É um processo regulatório que ocorre em todos os níveis da vida, desde células individuais até organismos complexos. A homeostase é fundamental para o funcionamento adequado dos sistemas biológicos. Envolve a regulação de diversas variáveis fisiológicas, como temperatura corporal, pH, níveis de glicose, pressão arterial, equilíbrio hídrico e concentração de íons, entre outras. Para que tudo isso funcione bem, é necessário que exista o Nerope, que para esses casos poderiam ser representadas por pelo funcionamento orquestrado de vários sistemas, principalmente o sistema nervoso interligados com nossos hábitos diários.  Durante o sono, por exemplo, ocorre um processo de filtragem do líquido cefalorraquidiano (LCR), que é um fluido claro e incolor que circula em torno do cérebro e da medula espinhal, fornecendo suporte e proteção, além disso também é durante o sono REM  que ocorre a formação de novas memórias no hipocampo, especialmente na consolidação da memória emocional e da memória procedural. Além do sono, fatores como alimentação balanceada e atividade física (mesmo que seja uma simples caminhada) são fatores imprescindíveis para manutenção da vida. A ingestão de ômega-3, antioxidantes, vitaminas do complexo B e polifenóis, associadas a dopamina, serotonina e o fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF) liberados/estimulados durante a atividade física, são responsáveis pela 
manutenção da saúde dos neurônios e promotores da neurogênese e neuroplasticidade. Esses apenas foram alguns exemplos aplicados ao conceito de “Nerope”.
 
     É impossível falar de vida e não falar de um sistema consciente, e o “Nerope” de certa forma acaba emanando uma consciência por trás do funcionamento dos sistemas que nos acompanha do nascimento até a morte, assim como acontece com os animais e a natureza, formando essa espécie de interconectoma, no qual todos os seres vivos e elementos naturais estão ligados uns aos outros. Durante a formação do embrião, por exemplo, é imprescindível que as células iniciais, chamadas células-tronco embrionárias, passem por diferenciação, o que significa que se especializam em diferentes tipos de células para formar os diferentes tecidos e órgãos do organismo. A metilação do DNA desempenha um papel fundamental na formação de células especializadas durante o desenvolvimento embrionário. A metilação é um processo químico no qual grupos metil são adicionados às bases de DNA. Essa modificação química pode afetar a expressão gênica, ativando ou desativando genes específicos. Esse, junto com outros vários mecanismos fisiológicos permitem nosso desenvolvimento, fazendo com que a necessidade do Nerope nos acompanhe durante toda nossa vida. 
 
    Crescemos, envelhecemos e morremos, e é nesse momento que o Nerope começa a se fazer ausente. No momento inicial da morte, algumas células podem permanecer metabolicamente ativas por um curto período. Essas células podem continuar a funcionar por alguns minutos devido à presença de energia e recursos metabólicos ainda disponíveis. No entanto, a morte de um organismo envolve muito mais do que apenas a morte das células individuais. A morte é um processo complexo que envolve a interrupção da coordenação e do funcionamento dos diferentes sistemas do corpo. A ressuscitação de um organismo após a morte é extremamente difícil, principalmente porque a morte resulta em danos extensos e irreversíveis em órgãos e tecidos. Durante o processo de morte, ocorrem mudanças bioquímicas e estruturais nas células e nos tecidos. Essas mudanças tornam difícil ou impossível reverter o processo de morte e restaurar a função normal dos órgãos. Além disso, a falta de oxigênio e o acúmulo de produtos metabólicos tóxicos podem causar danos irreparáveis às células e sistemas do corpo. A compreensão completa dos processos de morte celular e reversão ainda é uma área de pesquisa ativa. Mas será que se fornecermos formas de manter o Nerope possuímos conseguiremos reverter esse processo? Se conseguíssemos observar o processo de morte e manutenção de vida a partir dessa perspectiva, poderíamos avançar nas pesquisas em relação a esse tema? Essas perguntas são difíceis de serem respondidas visto que a nossa perspectiva científica já está bem estabelecida, mas talvez se encararmos a ciência de pontos de vista distintos, incluindo conhecimento de outros meios sociais como o próprio conceito nerope dos yanomamis, podemos encontrar possíveis respostas.
 



Referências:

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Rodrigo Oliveira

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