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Sinapse elétrica na consolidação de fonemas e palavras

 
     A linguagem pode ser definida como o sistema através do qual o homem comunica suas idéias e sentimentos, seja através da fala, da escrita ou de outros signos convencionais. A linguagem é uma das ferramentas mais importantes para a espécie humana, sendo aprimorada durante todo o processo evolutivo é considerada uma tecnologia de alto poder na construção, uso e transmissão e perpetuação da consciência entre os indivíduos por meio da comunicação. Nesse contexto, o reconhecimento de fonemas e palavras são imprescindíveis para que esse processo ocorra. Porém, para que isso aconteça, é necessária a aprendizagem de novas memórias consolidando diferentes tipos de sons e conjunto de letras para que seja possível posteriormente a identificação de fonemas e palavras, permitindo assim a nossa comunicação e linguagem. Neurofisiologicamente falando, o fortalecimento das sinapses são imprescindíveis para o processo de consolidação de novas memórias, podendo se destacar as sinapses do tipo elétrica. Aqui, vamos discutir qual o papel desse tipo de sinapse no processo de consolidação de fonemas e palavras e entender a neurofisiologia por trás disso.

    A consolidação de fonemas e palavras é um processo crucial no desenvolvimento da linguagem humana. Essa habilidade permite que as crianças unam diferentes sons e sílabas para formar palavras e frases significativas. A criança processa as informações que recebem do ambiente e as organiza em um sistema de regras que lhe permite compreender e produzir linguagem. Inicialmente vamos entender como processamos essas informações do ambiente.  Existem duas vias que conectam o córtex auditivo, localizado na zona superior do lobo temporal,  ao córtex frontal, onde cada caminho representa diferentes papéis linguísticos. A via do fluxo auditivo ventral é responsável pelo reconhecimento do som (quando ouvimos algo, como um tom, um ruído, ou uma palavra por exemplo), por esse motivo ela é conhecida como a via auditiva "o quê". Já a via do fluxo dorsal auditivo em humanos e primatas não humanos é responsável pela localização sonora e, por conseguinte, é conhecido como a via auditiva "onde". Em humanos, essa via (especialmente no hemisfério esquerdo) também é responsável pela produção da fala, repetição da fala, leitura labial, memória operacional fonológica e memória de longo prazo. De acordo com o modelo de evolução da linguagem, o processamento ocorre de "onde" para "o que". Ainda, após esse tipo de processamento, após chegar no córtex frontal, esses sons podem gerar algum tipo de reação ou sentimentos específicos, dependendo do contexto de vida do indivíduo. Além disso, outras áreas como o córtex occipital, responsável pela visão, também tem vias projetadas para o córtex frontal envolvidas com o processamento da linguagem, que para este caso, está relacionado com a leitura.  Após esse processamento, pode ocorrer ou não a consolidação dessas informações pelo cérebro. Quando o fonema ou palavras não forem relevantes ou apenas necessárias para a manutenção do diálogo e entendimento naquele momento (como conversar com uma pessoa, por exemplo) essas informações são armazenadas por um curtíssimo período, caracterizando a chamada memória de trabalho. Se for fonemas e palavras relevantes, elas serão consolidadas na memória de longo prazo. Nesse contexto, a repetição de fonemas, por exemplo, podem ser utilizadas para potencialização de um processo mnemônico, ou seja, para facilitar a memorização de palavras ou expressões. Isso ocorre, por exemplo, em algumas cantigas infantis em que as palavras são repetidas várias vezes, como na famosa "Atirei o pau no gato". A repetição de fonemas é um fenômeno linguístico que ocorre quando uma sequência de sons idênticos ou semelhantes é repetida em uma palavra ou em uma frase. Este fenômeno pode ser encontrado em diversos idiomas e pode ter diferentes funções comunicativas. Na língua portuguesa, por exemplo, a repetição de fonemas pode ser utilizada como recurso estilístico para criar um efeito de ênfase ou de ritmo na fala ou na escrita. Além disso, a repetição de fonemas também pode estar relacionada a alguns fenômenos culturais e religiosos. Em muitas tradições religiosas, por exemplo, a repetição de palavras ou de frases é usada como um tipo de meditação ou oração. É o caso, por exemplo, do mantra "Om" utilizado no hinduísmo e no budismo, que é repetido várias vezes como uma forma de alcançar um estado de tranquilidade e concentração.Trabalhos demonstraram que  que a repetição de palavras ou de sons pode ajudar na memorização de informações, pois estimula o cérebro a produzir novas conexões neurais em regiões específicas do cérebro, como o córtex pré-frontal e o córtex cingulado, que estão relacionadas à memória e ao processamento de informações verbais. 
 
     A consolidação de uma memória está fortemente relacionada à plasticidade sináptica, que é a capacidade das sinapses para se adaptarem e mudarem como resultado da experiência. Dessa forma, as sinapses desempenham um papel imprescindível para que o conjunto de fonemas e palavras sejam lembrados posteriormente resultando em uma comunicação.  As sinapses são responsáveis pelo processamento e transmissão da informação porque é nessa região que a informação chega em forma de potenciais de ação (informação elétrica) e é convertida em informação química através da liberação dos neurotransmissores. Neste sentido, essa região é fundamental para o processamento de toda informação que circula pelos neurônios. Dessa forma, há dois tipos de sinapses: química e elétrica. As sinapses químicas são eficientes e precisas, pois apresentam a capacidade de controlar, modular e transmitir todas mensagens elétricas (que chegam por meio do potencial de ação) e químicas (que chegam por meio de neurotransmissores), utilizando neurotransmissores como forma de interação entre os neurônios pré e pós sinápticos. Já as sinapses elétricas ocorrem quando o potencial de ação de um neurônio é transferido diretamente para o próximo neurônio, sem a necessidade de liberação de neurotransmissores químicos. A base celular dessas sinapses é a junção comunicante, um grupo de canais intercelulares que medeiam a comunicação direta entre neurônios adjacentes. Isso resulta em uma transmissão rápida e eficiente de informações quando comparadas a sinapses químicas. As sinapses elétricas podem ser encontradas em diversas regiões do SNC. Estas regiões incluem o hipotálamo, estriado, oliva inferior, hipocampo (principal área de consolidação da memória), bulbo olfatório, retina, córtex e cerebelo.
 





Referências:
 
Alcami, Pepe, and Alberto E. Pereda. "Beyond plasticity: the dynamic impact of electrical synapses on neural circuits." Nature Reviews Neuroscience 20.5 (2019): 253-271.
 
Hulstijn, J. H., & Sergent-Marshall, S. (2015). The effect of repetition on word form and meaning in a transparent orthography. Frontiers in Psychology, 6, 2094.
 
Iseki, K., Hanakawa, T., Shinozaki, J., & Fukuyama, H. (2017). Neural mechanisms underlying the repetition of phonemes: A functional magnetic resonance imaging study. NeuroImage, 157, 111-122.
 
Buzsáki, G., & Mizuseki, K. (2014). The log-dynamic brain: how skewed distributions affect network operations. Nature Reviews Neuroscience, 15(4), 264-278.
 
Kandel, E. R., Schwartz, J. H., & Jessell, T. M. (Eds.). (2013). Principles of neural science. McGraw-Hill Education.
 
Pineda, J. A., Singh, F., & Chepak, K. (2018). The Language and Structure of Social Cognition: An Integrative Process of Becoming the Other. The Neuroscience of Empathy, Compassion, and Self-Compassion, 267–283. doi:10.1016/b978-0-12-809837-0.00010-6
 


Rodrigo Oliveira

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