Sabemos que o comportamento humano é muito complexo e é resultado de uma variedade de fatores. Um comportamento específico, pode ser definido a partir de fatores genéticos (dependendo da expressividade ou não de um gene responsável por um comportamento inato), de fatores ambientais (relacionado com aprendizagem ao longo da vida) ou fatores relacionados a ambos (como é o caso da epigenética, onde fatores ambientais influenciam fenótipos do comportamento). Um exemplo disso, é a influência negativa de ambientes privados de estímulos positivos cognitivos, como uma boa base educativa por exemplo, que geram alterações cerebrais estruturais e funcionais durante todo o desenvolvimento do indivíduo. Sabendo dessa grande importância das influências ambientais na formação cognitiva comportamental de um indivíduo, surge o conceito de competências socioemocionais humanas, que são as capacidades individuais que se manifestam nos modos comportamentais de pensar (processar), sentir e gerar atitudes a partir de estímulos ambientais sociais, ou seja, é padrão frequente de ação e reação frente a estímulos de ordem pessoal e social. Assim, a criação dos filhos na família e em micro ambientes semelhantes nos primeiros anos de vida e a subsequente socialização do adolescente são voltados para o desenvolvimento de competências instrumentais necessárias para os papéis econômicos, políticos e sociais dos adultos.
Dessa forma, é importante desenvolvermos o máximo durante a infância de um indivíduo suas competências socioemocionais visando a potencialização de aspectos nos âmbitos cognitivo, social, emocional, cultural, entre outros. Considerando a importância de determinadas habilidades a serem desenvolvidas no meio educativo, adotamos um modelo que define doze competências humanas socioemocionais, sendo elas: executivas, jurídicas, legislativa, democrática, laica, Sentiência, de direito, humankind, Fruición, wellbeing, Metacognition e consciência. Aqui, vamos definir cada uma delas:
1.Executiva
É uma competência relacionada às funções cerebrais executivas e preza pela potencialização da aprendizagem implícita, motoras e cognitivas. Isso pode ser alcançado a partir do melhoramento dos hábitos de vida como um todo, focando na saúde mental e do corpo e nas relações pessoais. É o que devemos fazer e desenvolver para otimizar nosso tempo e eficiência na ação, não sendo restrito em executar um pensamento ou atitude. Uma pessoa executiva possui grandes habilidades para resolver problemas, sempre buscando manter seu bem estar, sempre sendo mais disciplinado, perseverante, eficiente e orientado para suas metas. Otimizar atividades do dia a dia como pensar, fazer, aprender, lembrar, comer entre outras são qualidades que pessoas executivas acabam criando de forma alternativa para facilitar suas atividades diárias de forma orgânica.
2.Jurídica
A competência jurídica está relacionada com a autoavaliação dos atos e decisões pessoais que impactam o social, como também avaliação dos atos relacionados ao micro ambiente de vivência ou sociedade que impactam na vida de um indivíduo, sempre respeitando. Uma pessoa jurídica sempre busca tomar decisões de acordo com as respostas obtidas após essas avaliações de atos constantes e de acordo com censo, justiça e ética pessoal e social, ou seja, busca avaliar o certo e errado pessoal e comunitário dentro dentro da moral e ética do meio social que está inserido se baseando no princípio da imparcialidade e livre de preconceitos ideológicos.
3.Legislativa
A competência legislativa é aquela que planeja as regras subjetivas e objetivas que regem uma vida direcionada ao senso de justiça, ética e moral dentro de um microambiente, ou seja, traçar regras para sua vida ou comunidade no intuito de se alcançar harmonia pessoal e social. Uma constante construção do mindset e metacognição, ou seja, organização frequente de seus pensamentos e aperfeiçoamento das formas de encarar situações do cotidiano. As regras subjetivas podem ser consideradas aquelas que você cria para se alcançar seus objetivos e está relacionada à autogestão, que indica a capacidade de ser organizado, esforçado, ter objetivos claros e saber como alcançá-los de maneira ética. Já as objetivas são os conjuntos de regras criadas em um microambiente ou comunidade no intuito de se manter a ordem e harmonia social através do planejamento de leis. Possuir uma perspectiva mais abstrata de ideias e pensamentos e além de conhecimento de outras sociedades, línguas e culturas ajuda a ter uma percepção legislativa mais ampla e um senso de justiça, ética e moral mais direcionado e justo.
4.Democrática
A competência democrática é aquela que indica o quanto uma pessoa tem a capacidade de manter relações em grupo entendendo que todos possuem direitos iguais, além de praticar isso com você mesmo, possuindo também essa percepção mais interna do "ser" de forma diplomática. Um indivíduo democrático absorve melhor as diferenças sociais além de ouvir e respeitar mais opiniões e vontades dos outros em questão, incluindo ideais que valorizem a liberdade de expressão, respeito às minorias, busca pela equidade e igualdade, tendo uma íntima relação com a abertura ao novo. O indivíduo aberto ao novo tem atitude investigativa, é curioso sobre o mundo, flexível e receptivo a novas ideias. Aprecia manifestações artísticas e estéticas diversas, busca entender o funcionamento das coisas em profundidade, pensam de formas diferentes e desenvolve ideias criativas e não convencionais e que refletem o seu comportamento social. Pessoas com alta abertura ao novo são mais hábeis em inovar e ter novas percepções sobre o mundo, aprender com erros e mostrar empolgação em criar. A busca do dividir, compartilhar, ceder, receber, avançar, ajudar entre outras formas de contribuir para evolução do outro como sociedade, se torna indispensável para quem busca ser democrático, sempre deixando o pré-julgamento de lado para desempenhar esse papel.
5. Laica
Esse tipo de competência está relacionada em aceitar e respeitar as demais religiões e costumes, inclusive a ausência dela, independente de imprintings culturais, que são comportamentos culturais aprendidos com aspecto inato durante desenvolvimento pessoal. A competência laica não tem nenhuma relação com o desapego de uma religião.A religiosidade é nata a todos os mamíferos e nos humanos tem seu ápice na concretização da forma subjetiva para se equilibrar com os problemas que não temos habilidades para resolver. Trazendo essa realidade para microambientes, interações interpessoais podem ser comprometidas além de ferir a integridade pessoal de outros indivíduos. É importante salientar que construir ideias apenas de respeito e de não aceitação na crença ou não crença do outro torna a necessidade de aprovação pessoal para a continuação da prática religiosa/cultural, fugindo dos conceitos de competência laica. Além disso, uma pessoa laica também pode se permitir experienciar a diversidade religiosa como um processo de "degustação da espiritualidade". Nesse sentido, busca-se desenvolver sua própria subjetividade religiosa e buscar experimentar e se mostrar aberto a outras possíveis experiências religiosas e culturais que fogem da sua de base, criando sua própria percepção espiritual e projetando uma relação íntima com a religião e cultura do próximo por mais que seja diferente da sua.
6. Sentiência
A sentiência é a capacidade de se ter experiência de sensações básicas /sentimentos como fome e sede, calor e frio, é um fenômeno psicobiológico, envolvendo padrões dinâmicos de ondas eletroquímicas em sistemas vivos, ou seja, essa competência está relacionada a sentir e processar emoções que geram uma resposta comportamental. Todo esse processo está intimamente ligado com a atividade cerebral límbica, que são atividades relacionadas a áreas cerebrais responsáveis pela emoção. Sentir e processar cada emoção tanto a nível cognitivo quanto a nível corporal antes de tomar alguma atitude é muito importante para moldar comportamentos coerentes com o bem estar pessoal e social. Uma pessoa com "sentiência" nunca age por impulso ou com desequilíbrio de emoções. Conhecer e gerenciar os próprios sentimentos e emoções pessoais e projetados, além de também possuir essa sensibilidade perceptiva das emoções e comportamentos sentientes do outro é imprescindível para gerar uma ação adequada e constante.
7. De Direito
A competência de Direito está relacionada com basear suas posições e atitudes em fatos, sempre buscando entender uma posição sem tomar parte na ausência de fatos. Uma pessoa com essa competência sempre preza pela justiça, e não se deixa levar por levantamentos duvidosos presentes em seu ambiente para influenciar sua tomada de decisão diante de uma questão pessoal ou social que venha repercutir em sua vida. Possui relação com a competência jurídica sendo que está mais voltada para análise do ambiente em que o indivíduo está inserido. Seguir as regras e a constituição local, se atentar minuciosamente aos fatos, buscando eliminar fatores negativos que funcionem como obstáculo, como informações ou fatos falsos ou de confiança suspeita, é importante para uma tomada de decisão justa e certa no contexto no qual você se encontra inserido.
8. Humankind
Essa competência está relacionada intimamente com o comportamento humano, que por sua vez se caracteriza pela relação entre as pessoas inseridas em cenário social que estiverem incluídos, ou seja, é o modo de agir das pessoas em face ao seu ambiente, ditando, assim, seu padrão de conduta de acordo com seu grupo social. Desse modo, os padrões sociais influenciam se um comportamento pode ser considerado bom ou mau. Assim, saber reagir a cada comportamento é fundamental para se viver em sociedade. Humankind é uma competência associada à humanidade individual e de nossas relações sociais visando alcançar uma espécie de harmonia de convivência recíproca. O ser humano é bom por natureza dentro das competências e necessidades básicas supridas, sendo capaz de agir baseada em princípios e sentimentos de compaixão, justiça e acolhimento, visando o não egoísmo e solidariedade. Isso reflete o quanto uma pessoa consegue conectar-se com os sentimentos de outras e a capacidade de se colocar no lugar dela. O indivíduo "Humankind" apresenta preocupação com a harmonia social e valoriza a boa relação com os outros. É geralmente respeitoso, amigável, generoso, prestativo e disposto a confiar nas pessoas.
9.Fruición
A competência de "Fruición" está relacionada com autogestão, indicando a capacidade de ser organizado, esforçado, e ter objetivos claros e saber como alcançá-los de maneira ética com intuito de "fluir" 100% em todas as atividades diárias, ou seja, desenvolver o aproveitamento do máximo da sua capacidade de sua execução por meio da da organização. Relaciona-se à habilidade de fazer escolhas na vida profissional, pessoal ou social, estimulando a liberdade e a autonomia. Quem é capaz de exercer mais a Fruición apresenta-se como alguém mais disciplinado, perseverante, eficiente e orientado para suas metas. Pessoas com essa competência bem desenvolvida têm mais facilidade em estruturar e gerenciar com cuidado e antecedência suas atividades. São pontuais, organizados e lidam bem com o tempo para se alcançar seus objetivos.
10. Wellbeing
A competência Wellbeing é a busca constante do bem estar dentro das tensões corporais necessárias para desempenhar as tarefas diárias de forma harmônica e não conturbada. Pode ser caracterizada como valor prudencial ou qualidade de vida, refere-se ao que é intrinsecamente valioso em relação a alguém. Portanto, o bem-estar de uma pessoa é o que é, em última instância, bom para essa pessoa, o que é do interesse próprio dessa pessoa. Várias ferramentas podem ser levadas para se alcançar esse bem-estar genuinamente puro, dentre elas se destaca a resiliência emocional. A Resiliência emocional está relacionada à capacidade de alguém lidar com as próprias emoções, demonstrando equilíbrio e controle sobre suas reações emocionais adversas, como por exemplo raiva, insegurança e ansiedade, sem apresentar mudanças bruscas, o que leva a mudanças em seu comportamento. Pessoas com maior nível dessa competência confiam mais em suas capacidades para desenvolver tarefas e regular suas emoções. Já aquelas com níveis mais baixos tendem a ser emocionalmente mais instáveis, afetando-se facilmente pelas situações cotidianas. Pode ser difícil para elas voltarem a um estado emocional de tranquilidade uma vez que tendem a serem mais irritadas, ansiosas e impulsivas. Indivíduos que desenvolvem resiliência emocional conseguem lidar com situações adversas com tranquilidade e positividade, garantindo-lhes bem estar.
11. Metacognition
Essa competência está relacionada com a capacidade do indivíduo de monitorar e autorregular seus próprios processos cognitivos (automonitoramento do ato cognitivo), ou seja, é a forma como um indivíduo pensa e como ele pode "configurar seus pensamentos" a partir de mecanismos introspectivos livres de conceitos prévios, por meio de uma linha de raciocínio mais "ingênua/inocente". . Assim, é a partir da metacognition que enfrentaremos as mais diversas situações do cotidiano, utilizando de suas vantagens para nossas tomadas de decisões diariamente, sempre buscando aprender sobre o processo de aprendizagem ou apropriação e domínio de recursos internos relativos a objetos externos. A metacognition pode influenciar na melhora da aprendizagem e no controle atencional.
12. Consciência
A consciência é uma qualidade da mente, considerando abranger qualificações tais como subjetividade, autoconsciência, sentiência, sapiência, e a capacidade de perceber a relação entre si e um ambiente. A consciência pode ser vista como o conjunto dos dados da experiência individual que se oferece ao conhecimento imediato. Essas experiências individuais a tornam um alvo de pesquisas neurocientíficas para entender como elas podem ser processadas no nosso cérebro, observando o seu conteúdo consciente e autoconsciente. Essa percepção individual engloba principalmente modos particulares de se perceber diversas sensações que sentimos em nosso dia-a-dia. Como uma competência está relacionada ao despertar as habilidades de mudar seu estado de consciência bem como controlar com atenção diante das inundações dos estímulos do ambiente. Conseguir identificar tipos de consciência é muito importante nesse processo para você conseguir evocá-la quando necessário de acordo com as adversidades do meio. Uma pessoa consciente é aquela que sempre busca desenvolver o controle dos padrões de consciência mental e corporal para termos os vários tipos de experiências. Possui relação com a competência Laica, mas neste caso é com cada possibilidade de consciência dentro do seu corpo. A consciência pode ser considerada passiva, reativa ou ativa. A consciência passiva é aquela na qual temos uma vaga e uma confusa percepção de nós mesmos e do que se passa à nossa volta, como no devaneio, no momento que precede o sono ou o despertar, ou até mesmo durante uma anestesia, por exemplo. Já a consciência reativa (ou consciência vivida não reflexiva) é nossa consciência efetiva, que tem a peculiaridade de ser egocêntrica, isto é, de perceber os outros e as coisas apenas a partir de nossos sentimentos com relação a eles, como, por exemplo, a criança que bate numa mesa ao tropeçar nela, julgando que a mesa “fez de propósito” para machucá-la. Por outro lado, a consciência ativa (ou reflexiva) é aquela que reconhece a diferença entre o interior e o exterior, entre si e os outros, entre si e as coisas. Esse grau de consciência é o que permite a existência da consciência em suas quatro modalidades, isto é, eu, pessoa, cidadão e sujeito. Saber diferenciar cada tipo de consciência pode ajudar a desenvolver mecanismos de controle conscientes de forma mais acurada em diferentes situações da vida.
Referências:
Su, Yu-Sheng, Hung-Yue Suen, and Kuo-En Hung. "Predicting behavioral competencies automatically from facial expressions in real-time video-recorded interviews." Journal of Real-Time Image Processing (2021): 1-11.
Cruz-Albarran, Irving A., et al. "Human emotions detection based on a smart-thermal system of thermographic images." Infrared Physics & Technology 81 (2017): 250-261.
Ogbu, John U. "Origins of human competence: A cultural-ecological perspective." Desenvolvimento infantil (1981): 413-429.