Processamento emocional em crianças com comportamento opositor Jiwasa rachado entre mãe e filho e o que o fNIRS revela do corpo que luta com as emoções
09/12/2025 at 04:12:09
Author: Jackson Cionek
09/12/2025 at 04:12:09
Author: Jackson Cionek
(Consciência em Primeira Pessoa • Neurociência Decolonial • Brain Bee • O Sentir e Saber Taá)
O Sentir e Saber Taá — abrindo a fresta de descolonização
Eu vejo uma criança dizendo “não” o tempo todo.
Ela fecha a cara, cruza os braços, provoca, desafia.
Sinto, no meu corpo, a mistura de cansaço, raiva, culpa e amor.
Uma parte de mim pensa:
“ele é teimoso”,
“ela é desobediente”,
“esse menino vai dar problema”.
Meu Taá sente primeiro: sente o desgaste, o conflito, o embate diário.
Mas eu sei que o Taá também erra:
assim como sinto que o Sol gira em torno da Terra,
assim como sinto que a lua é maior no horizonte,
eu posso sentir que essa criança “é ruim” —
quando, na verdade, algo muito mais profundo está acontecendo no corpo dela.
Também percebo que até as palavras que uso para falar dessa criança foram colonizadas.
O idioma com que descrevo o “filho difícil” foi moldado para reduzir:
reduzir o corpo a máquina defeituosa,
a mente a déficit,
a espiritualidade a superstição,
a política a obediência, consumo e produtividade.
É assim que muitos modelos científicos e clínicos ainda olham para o comportamento opositor:
como falha, desvio, problema a ser corrigido, e não como um Jiwasa rachado —
um pronome singular inclusivo entre mãe e filho que perdeu sua continuidade de pertencimento.
Quando eu sinto meu corpo antes de pensar — quando Taá se manifesta —
eu percebo que não existe separação entre Neurociência, Política e Espiritualidade (Utupe, Xapiri, memória viva).
O que coloniza não é só a história:
é a palavra que chama de “transtorno” aquilo que talvez seja também um grito de contexto, de violência, de não-pertencimento.
Cada descoberta científica, quando lida com coragem, é uma fresta de liberdade que rompe a Zona 3 e devolve o corpo — inclusive o corpo da criança rotulada como “opositora” — ao que sempre foi: território vivo de mundos possíveis.
É nesse espaço que leio o estudo de Peizhong Wang, Ting He, Wenrui Zhang, Peilian Chi e Xiuyun Lin, publicado em 2025 em Social Cognitive and Affective Neuroscience:
“Emotion process deficits in children with ODD and their associations with different dimensions of ODD symptoms: A fNIRS study.”
A pergunta científica: o que acontece com a emoção no cérebro da criança “opositora”?
Oppositional Defiant Disorder (ODD) é descrito como um padrão persistente de:
humor irritável,
comportamento desafiador,
discussões e ressentimento.
Mas os autores perguntam algo mais fino:
Quais processos emocionais, no cérebro, estão alterados nessas crianças?
E como essas alterações se conectam às duas dimensões centrais do ODD: sintomas afetivos e sintomas comportamentais?
Para isso, eles usam fNIRS para olhar diretamente a hemodinâmica pré-frontal enquanto as crianças:
reconhecem emoções em rostos (ERC – emotion recognition),
regulam suas emoções diante de estímulos emocionais (ERG – emotion regulation).
Como o estudo foi feito: fNIRS, GLM, HRF e caminho duplo da emoção
Foram avaliadas 72 crianças:
35 com ODD,
37 com desenvolvimento típico (grupo controle).
Todas realizaram tarefas de:
reconhecimento emocional (ERC) – identificar expressões emocionais,
regulação emocional (ERG) – modular a reação a estímulos emocionais.
Enquanto isso, a atividade do córtex pré-frontal era medida por fNIRS, com foco em regiões como:
SFGmed (giro frontal superior medial),
SFGdor (giro frontal superior dorsolateral),
MFG (giro frontal médio).
Pipeline de análise (modo Brain Bee)
Os sinais de concentração de O₂-Hb e HHb foram ajustados com GLM (General Linear Model),
usando uma HRF (Hemodynamic Response Function) adequada ao tempo da tarefa.
Foram considerados short-channels para capturar ruído superficial (pele, vasos extracorticais), aumentando a chance de que o que sobra seja, de fato, atividade cortical.
Técnicas de ICA/PCA ajudam a separar componentes fisiológicos (respiração, batimento, movimento) dos componentes relacionados à tarefa.
Depois, os autores empregam análises de caminho (path analysis),
uma forma de análise multivariada que testa como déficits neurais em certas áreas
se conectam a diferentes dimensões de sintomas afetivos e comportamentais.
O que foi encontrado: o cérebro parece “normal” no comportamento, mas silencioso na emoção
Algo muito forte aparece nos resultados:
As crianças sem ODD mostram ativações robustas no pré-frontal:
direito MFG,
direito SFGdor,
bilateral SFGmed durante o reconhecimento de emoções (ERC),
e direito SFGdor durante regulação emocional (ERG).
As crianças com ODD não mostram esses padrões de ativação clara,
apesar de o comportamento nas tarefas (acertos, erros) não ser tão diferente.
Ou seja:
Do lado de fora, a performance pode parecer “ok”;
do lado de dentro, o pré-frontal não está engajando da mesma forma.
Quando os autores fazem a path analysis, encontram um “caminho duplo”:
Déficits neurais na SFGmed durante reconhecimento emocional (ERC) preveem mais sintomas afetivos (irritabilidade, ressentimento).
Déficits neurais na SFGdor durante regulação emocional (ERG) preveem mais sintomas comportamentais (discussões, desafio aberto).
Eles propõem um modelo de duplo processamento da emoção no ODD:
Um eixo mais afetivo – ligado a como a criança reconhece e sente a emoção.
Um eixo mais comportamental – ligado a como ela regula (ou não) essa emoção.
Lendo com nossos conceitos: Jiwasa rachado, Jiwasa a reconstruir
Quando olho para esses dados com nossos conceitos, vejo vários níveis:
Mente Damasiana e Eus Tensionais
A Mente Damasiana diz que consciência vem do encontro entre:
interocepção (sensações internas),
propriocepção (posição e movimento do corpo).
No ODD, os dados sugerem que:
a criança vê o rosto,
mas o pré-frontal não organiza direito a ponte entre o que ela sente e o que ela faz;
o Eu Tensonal que aparece é um eu de defesa, luta, oposição —
um modo de existir que protege da dor emocional, mas rompe o fluxo com o outro.
Quorum Sensing Humano e Jiwasa
Em vez de pensar “criança-problema”, penso em Jiwasa:
um pronome singular inclusivo, que é ao mesmo tempo “eu” e “nós” entre mãe e filho.
Num Jiwasa saudável:
o corpo da mãe regula o da criança,
o tom de voz, o olhar, o toque criam um campo de co-regulação,
o QSH (Quorum Sensing Humano) está íntegro.
Nos quadros de ODD, muitas vezes:
o Jiwasa está rachado,
a criança e o cuidador não conseguem mais entrar na mesma frequência,
gestos de cuidado são percebidos como ameaça,
limites viram guerra.
Mesmo que esse estudo específico não meça a díade diretamente,
ele mostra como por dentro o cérebro da criança já está organizado para a luta,
não para a co-regulação.
DANA e destino não fixo
A DANA — inteligência do DNA — não escreveu no código “criança desafiadora para sempre”.
Ela escreveu: sistema plástico, que pode:
aprender regulações mais finas,
encontrar novos caminhos para o pré-frontal se engajar,
reconstruir o Jiwasa com apoio, tempo e contexto.
Arte latino-americana como espelho desse Jiwasa rompido
Quando penso em crianças com comportamento opositor em contextos latino-americanos,
me vem à mente Eduardo Galeano em “Los nadies” —
“os ninguéns” que não contam, que não medem, que não aparecem nas estatísticas,
e que só são notados quando “dão trabalho”.
A criança com ODD muitas vezes é um “nadie” emocional:
ninguém pergunta o que o corpo dela está tentando dizer,
ninguém mede o custo fisiológico de viver em conflito permanente,
ninguém vê o pré-frontal silencioso tentando não desmoronar.
Ler esse artigo com Galeano ao lado é lembrar que:
não existe ODD fora da história, da pobreza, da violência, do racismo,
nem fora das expectativas coloniais de obediência e produtividade.
Avatar e recorte BrainLatam2026
Ao nos referenciarmos no avatar Olmeca,
consigo ver esse estudo como um recorte que mostra
como a cultura, a família e a escola intermediam o cérebro da criança:
o rosto não é só um estímulo neutro;
é o rosto da mãe cansada, do professor irritado,
da figura de autoridade que carrega séculos de colonização nas palavras que usa.
Olmeca me lembra que não é só pré-frontal que está em jogo,
mas também o modo como a cultura define o que é “criança boa” e “criança difícil”
dentro de uma história latino-americana em que quem resiste sempre foi punido.
Onde a ciência ajusta nossas ideias
Esse artigo corrige várias simplificações:
Mostra que não basta olhar para o comportamento:
a criança pode “acertar” na tarefa, e mesmo assim o cérebro não engajar como o de uma criança típica.
Mostra que afeto e comportamento são eixos diferentes:
sintomas afetivos se conectam mais a déficits em reconhecimento emocional,
e sintomas comportamentais, a déficits em regulação.
Sugere que falar apenas em “falta de limites” é curto demais:
há um padrão neurohemodinâmico específico, um modo de corpo-cérebro operando no mundo.
Para nós, isso confirma que:
Zona 3 não é só ideologia política;
pode ser também um estado em que a criança está presa em padrões de defesa,
com pouca margem para Zona 2 de fruição, jogo e criação.
A saída não é só punir ou medicar,
mas criar contextos que reconstruam o Jiwasa,
com paciência, arte, cultura e ciência com evidência.
Implicações para educação, clínica e políticas LATAM
Escola
Formação de professores para entender ODD como questão de processamento emocional, não apenas de disciplina.
Espaços de regulação emocional na escola (música, movimento, respiração, arte).
Clínica
Uso de fNIRS e outras técnicas não como rótulo, mas como forma de mostrar à família que há um cérebro em esforço — não um caráter “estragado”.
Políticas públicas
Programas de apoio à parentalidade em territórios vulneráveis,
pensando o Jiwasa mãe–filho como unidade de cuidado.
Políticas que reconheçam que externalização de raiva na infância muitas vezes é resposta a contextos coloniais de humilhação, racismo e miséria.
Palavras-chave para busca científica
“Wang 2025 Emotion process deficits in children with ODD dimensions fNIRS prefrontal ERC ERG SFGmed SFGdor Social Cognitive and Affective Neuroscience”
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